
No universo das ultramaratonas, onde os treinos ultrapassam distâncias e durações extremas, conhecer seu corpo é essencial. Uma das ferramentas mais eficazes para isso é utilizar zonas de frequência cardíaca (FC) como guia. Neste artigo, você verá como embasar seu treinamento em estudos científicos — e como aplicar isso de forma prática no dia a dia.
1. A Base Científica do Treino por FC
1.1 Adaptações do Treino em Zona 2 (Long Slow Distance)
A estratégia conhecida como Long Slow Distance (LSD) — ou Zona 2 em termos de FC — é amplamente reconhecida por melhorar a capacidade cardiovascular e a queima de gordura, sem causar desgaste excessivo. Estudos mostram que 70–80% do treino de atletas de elite é realizado em intensidade moderada, dentro da Zona 2, dedicando menos tempo a esforços intensos (Seiler & Tønnessen, 2009).
1.2 Mudanças da FC e HRV em Provas Extremas
Pesquisas mostram que após provas de 100 milhas há um aumento de cerca de 19% na FC basal e queda significativa na variabilidade da FC (HRV) — mesmo após uma semana de recuperação (Vitiello et al., 2020).
1.3 Ritmo da FC Durante Ultramaratonas de 24 Horas
Em estudo sobre ultramaratona de 24 horas, corredores mantiveram FC entre 64% e 71% da FC máxima, com queda para ~54% após 18h — reforçando a importância de um ritmo conservador (Millet et al., 2018).
2. Por que Treinar com FC é Essencial para Ultramaratonistas
2.1 Controle de Intensidade e Sustentabilidade
Manter-se na Zona 2 (57‑63% da FC máxima) permite melhorar a eficiência metabólica e preservar energia para longas distâncias.
2.2 Monitoramento do Estado Fisiológico
Alterações na FC basal e HRV ajudam a detectar fadiga acumulada, sinalizando necessidade de recuperação antes de novas cargas.
2.3 Estratégia de Ritmo em Prova
Manter a FC entre 60–70% da FC máxima ajuda a evitar declínios bruscos de desempenho ao longo da prova.
3. Como Estruturar o Treino: Da Teoria à Prática
3.1 Teste de Limiar Lactato e Definição de Zonas
Evite fórmulas genéricas como “220 – idade”. Utilize testes de esforço máximo ou limiar lactato para estabelecer zonas reais.
3.2 Distribuição de Intensidades
- 75 a 91% do tempo em Zona 2
- 4–6% em zona moderada
- 3–8% de alta intensidade
3.3 Exemplo Semanal de Treino
Dia | Intensidade | Duração |
---|---|---|
Segunda | Zona 2 (LSD) | 60–120 min |
Terça | Intervalado (Zona 4) | 20–40 min + aquecimento |
Quarta | Zona 2 + força | 60–90 min |
Quinta | Zona 3‑4 | 40 min |
Sexta | Recuperativo (Zona 2) | 60 min + mobilidade |
Sábado | Longão em Zona 2 | 3–5 h |
Domingo | Regenerativo (Zona 1‑2) | 90 min |
3.4 Percepção de Esforço (RPE)
Use a escala RPE (1 a 10) junto da FC para validar a intensidade — principalmente em condições como calor, estresse ou altitude.

4. Cuidados e Limites
4.1 Fatores que Interferem na FC
Temperatura, desidratação, cafeína e emoções influenciam a FC. Use a percepção de esforço como complemento.
4.2 Riscos do Excesso
Treinos extremos sem descanso adequado podem causar alterações cardíacas como fibrose e arritmias. O equilíbrio é fundamental.
5. Conclusão
Treinar por frequência cardíaca oferece controle, eficiência e longevidade ao ultramaratonista. Usar a Zona 2 como base, integrando estímulos mais intensos com sabedoria, traz ganhos significativos e evita sobrecargas.
Você já treina por frequência cardíaca? Compartilhe sua experiência nos comentários e ajude outros ultramaratonistas!
Referências
- Seiler, S. & Tønnessen, E. (2009). Distribution of Training Intensity in Elite Endurance Athletes.
- Vitiello, D. et al. (2020). Cardiac Autonomic Recovery After Ultramarathon.
- Millet, G. et al. (2018). Heart Rate Dynamics During a 24-Hour Ultra.